sábado, 15 de março de 2014

Capítulo 1 - O encontro

As luzes da cidade iluminavam a noite daquele domingo frio de Janeiro. Não era uma data relevante para mim como um aniversário ou coisa do gênero, mas estava  muito ansiosa por causa da ligação que havia recebido do meu primo Mike mais cedo. O meu primo era um homem de mais ou menos 28 anos, nós dois costumávamos brincar quando éramos crianças. Depois começamos a criar uma certa distância à medida que fomos amadurecendo, mas nunca perdemos o contato nem sequer por um mês.


A ligação de Mike foi breve, me pediu para encontrá-lo em um bar no centro da cidade. Por motivos lógicos tive que me esconder debaixo de meu echarpe francês aderido durante uma de minhas viagens de trabalho, afinal de contas, nenhuma celebridade poderia andar livremente de cara limpa sem ser notada no Japão, principalmente se tratando de mim.

A minha cabeça não parava de formar uma cena horripilante, onde as mãos de Mike escorregavam das minhas e ele gritava "Socorro me ajude!" enquanto era arremessado em um abismo. Eu estava perturbada pela voz triste que ele usara ao telefone, nem precisava me esforçar para perceber.

Pensando naquela imagem tentei chegar o mais rápido que podia no local marcado.

o chão estava extremamente liso e minhas botas de inverno em tom marrom claro, a cada passo pareciam que não se fixavam direito ao chão, mas nada me impediria de chegar no bar, nem mesmo aquele chato contratempo.

Quando cheguei ao bar de nome Fujita, discretamente o procurei com o olhar. Ele estava sentado tomando uma bebida, que pela forma como agitava o copo, imaginei ser um uísque. Ao me a vistar, Mike acenou com um sorriso um tanto forçado.

Aquele sorriso pareceu partir meu coração de um jeito tão doloroso que sentia como se fosse chorar a qualquer instante, só que chorar na frente dele não ajudaria em nada, por isso contive meus sentimentos para finalmente me aproximar dizendo:

-Olá, sua ligação me deixou preocupada... Afinal de contas o que houve com você?- Eu estava tentando usar o tom mais calmo que podia, só que logo Mike percebeu o quanto estava desconfortável pelo timbre.
-Ayu... Não se preocupe tanto... Eu estou me separando- Ele disparou sem cerimônias 
-Do que você está falando? Como assim? Você e a Arisa-san... Por quê? - Eu parecia congelada sobre o meu lugar, meu coração acelerou ao mesmo tempo que o sentia apertar de jeito tão forte que por um segundo achei que iria sufocar.
-Não existe mais amor entre nós dois, agora cada um tem que seguir sua vida, certo?- Ele falava com tanta naturalidade que pensei que estava somente tentando manter sua posição forte de homem inabalável.
-É tão fácil assim dizer que não existe mais amor? Por que está aqui bebendo então?- A minha ingenuidade aflorava sem que eu mesma percebesse.
-Acho que ela arrumou alguém melhor, alguém que supre mais suas necessidades que eu- Aquilo foi tão desprendido que chegou a me dar pena, mas mal eu sabia o motivo real da separação.
-Ora! Não seja bobo, não acredito que ela encontre alguém melhor que você- Falei de uma maneira descontraída.

Ele ignorou meu comentário novamente levando o copo de bebida à boca.

No segundo seguinte, ele perdeu o equilíbrio caindo da cadeira, e percebendo o vacilo de seu corpo rapidamente me coloquei à sua frente para tentar apoiá-lo. Desviei meu olhar analisando a nossa situação, e assim que vi que a cena havia despertado a curiosidade dos presentes, passei o braço de Mike em meu pescoço e falei baixinho:

-Melhor sairmos deste lugar, as pessoas estão nos olhando... - Na verdade, minha maior preocupação era ser descoberta.
Poderiam maldar aquela situação, o que sem dúvidas daria a página principal do jornal de fofocas no Japão ou uma vasta matéria na Apple Daily de Taiwan.
-Você sempre tão preocupada com os olhares- Ele falou aquilo se atirando em mim como se fosse ter um ataque histérico. 

Imediatamente o puxei fazendo muito esforço para tirá-lo do lugar, mas antes, claro tive que acertar a conta por aquela farra que ele tinha tido no bar. Saímos de lá, então me vi obrigada a pegar um táxi para o deixar em casa, porque não teria forças suficiente para carregá-lo durante uma grande distância.

Mesmo a distância pequena do bar a rua já estava me deixando no limite, o que fazia os músculos envolta do obro ficarem dormentes.

O primeiro táxi que parou entramos, e depois de 30 minutos mais ou menos chegamos à casa dele, na verdade a casa não era dele, mas sim de um amigo que estava morando em New York.

Mike apenas pediu emprestado por um tempo pelo que me falou resmusgando quando estava bêbedo dentro do táxi. A casa dele já não existia, porque estava sob avaliação no processo de divórcio e foi acordado entre ele e a esposa, Arisa, que nenhum dos dois poderia morar nela.

Eles achavam que era melhor vender, depois cada um determinaria o que faria com sua parte arrecadada na venda do imóvel.

Quando entrei na casa levei um certo susto: A bagunça era tamanha que quase tropeçava andando pela sala, de tanta coisa que havia espalhada pelo chão.

Claro que meu primo não tinha muita percepção sobre organização, embora tivesse outra ideia sobre que tipo de pessoa ele era.

Deixando o homem sobre o sofá me direcionei à cozinha, e lá preparei um jantar especial que o ajudaria a melhorar boa parte da ressaca em seu corpo. Para minha surpresa, quando retornei à sala ele estava sentado no sofá com uma expressão pensativa.

Levei a bandeja até a mesa ao centro da sala que tinha uma porção de livros em cima, o que despertou minha curiosidade.

-Do que se tratam todos esse livros?- Estava tentando me manter formal como sempre, só que de alguma forma, pela nossa antiga proximidade a sonoridade sai com tom de informalidade.
-São uma pequena distração para o tempo que não penso em me matar- Ele falou como se estivesse irritado comigo.
-Desculpe, somente uma curiosidade idiota... -Deixei transpassar o quanto me senti estranha pelo tom que ele falava.
-Tudo bem, sou eu que devo me desculpar, afinal estou te alugando novamente com as minhas coisas. Você se senti bem com isso?- Ele passou a mão no meu cabelo com suavidade, naquele instante senti como se fosse o meu primo de antigamente, o garotinho que costumava sorrir, correr e fazer piadas comigo se fosse para me alegrar.
-Eu... Ah! Claro que estou bem, mas que tipo de pergunta é essa?- Falei um pouco nervosa, sentia meu peito acelerado, enquanto pensamentos estranhos como flashes me faziam tremer por fora.

Depois da minha resposta um silêncio foi pairando pelo ar de um jeito agoniante.

Comecei a imaginar que talvez ele tivesse notado algo diferente em mim, contudo Mike não estava nem ai para o que estava falando.

Antes estivesse, porque na verdade a cabeça dele só se consumia por pensamentos egoístas, pois vivia acreditando que o mundo girava aos seus pés.

Talvez esse problema não se relacionasse diretamente e unicamente com ele, é um problema notório que a maioria dos caras bonitos sofre.

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